Recentemente postei em “Os Invicioneiros” texto que comentava sobre polêmica surgida acerca do livro “Por uma vida melhor”, de Heloísa Ramos. Não vou me aprofundar sobre o post, mas fiquei surpreso pelos comentários e, sobretudo, pela polêmica em si nas redes sociais de um modo geral.
Trata-se de um tema árduo. Escrevo aqui neste meu Poetopias a respeito desse tema, sem, no entanto, querer discuti-lo. Antes quero ironizá-lo. Para tanto, valho-me de brilhantes companhias que ora convoco para ajudar-me: Paulo Leminski, Carlos Drummond de Andrade, Camões e Oswald de Andrade.
Não tecerei maiores comentários. Meus amigos falam o suficiente.
O Assassino era o Escriba
Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente.
Um pleonasmo, o principal predicado de sua vida,
regular como um paradigma da 1ª conjugação.
Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial,
ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito assindético
de nos torturar com um aposto.
Casou com uma regência.
Foi infeliz.
Era possessivo como um pronome.
E ela era bitransitiva.
Tentou ir para os EUA.
Não deu.
Acharam um artigo indefinido em sua bagagem.
A interjeição do bigode declinava partículas expletivas,
conectivos e agentes da passiva, o tempo todo.
Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça.
Fontes: Paulo Leminski.Caprichos e relaxos.São Paulo: Brasiliense,1983.
Aula de português
A linguagem
na ponta da língua,
tão fácil de falar
e de entender.
A linguagem
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que ela quer dizer?
Professor Carlos Góis, ele é quem sabe,
e vai desmatando
o amazonas de minha ignorância.
Figuras de gramática, esquipáticas,
atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me.
Já esqueci a língua em que comia,
em que pedia para ir lá fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a prima.
O português são dois; o outro, mistério.
Carlos Drummond de Andrade © Graña Drummond
Erro de português
Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena! Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português
Pronominais
(Oswald de Andrade)
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro